quinta-feira, 19 de agosto de 2010

A vida assim nos afeiçoa.

Se fosse dor tudo na vida,
Seria a morte o sumo bem.
Libertadora apetecida,
A alma dir-lhe-ia, anciosa:- "Vem!"

"Quer para a bem-aventurança
"Leves de um mundo espiritual
"A minha essência, onde a esperança
"Põs o seu hálito vital;

"Quer, no mistério que te esconde,
"Tu sejas, tão-somente, o fim:
"-Olvido imperturbável, onde
"Não restará nada de mim!"

Mas horas há que marcam fundo...
Feitas, em cada um de nós,
De eternidade de segundo,
Cuja saudade extingue a voz.

Ao nosso ouvido, embaladora,
A ama de todos os mortais,
A esperança prometedora,
Segreda coisas irreais.

E a vida vai tecendo laços
Quase impossiveis de romper:
Tudo o que amamos são pedaços
Vivos do nosso próprio ser.

A vida assim nos afeiçoa,
Prende. Antes fosse toda fiel!
Que ao se mostrar às vezes boa,
Ela requinta em ser cruel...

                                                          Manuel Bandeira.








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